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29.9.07

O APARTHEID SOCIAL DE LUANDA



Angola continua sendo um pais de profundas contradições socioeconómicas, como estas duas faces de Luanda evidenciam. Um litro e meio de água natural por exemplo custa duzentos kwanzas (mais de dois euros), quando uma cerveja anda a volta dos 50 Kz (cerca de 50 cêntimos de euros), a água três vezes mais caro em relação ao álcool. Entretanto, ganhar o equivalente a duzentos ou quatrocentos dólares por mês em Angola é coisa de pouca gente considerada felizarda, na sua maioria estrangeira. Mas, é admirável a ostentação de riqueza da parte de certos patrícios: muitos carros caríssimos em Luanda nunca vi sequer em Roma, uma das principais cidades do mundo. Entretanto, a maioria esmagadora de gente aqui sobrevive em condições difíceis. Paradoxalmente, é muito comum ver-se aqui gente com mais de um telemóvel, até um meu primo morando numa aldeia sem electricidade tem telemóveis! As pessoas ainda não se apercebem dessa roubalheira.
Quando recentemente regressei a Angola, depois de três anos na Europa, Luanda pareceu-me uma imensa e confusa Sanzala, uma grande aldeia do mato. Tudo castanho, vermelho, esburacado, empoerado. O movimento agitado das pessoas, a poluição sonora das ruas e o gingar dos candongueiros aumentavam em mim a sensação de caos, mas, os kandandos e assobios dos velhos kambas e familiares logo se encarregaram de suscistar em mim o entusiasmo nostálgico que parecia esvanecer dentro. Para matar saudades, disse a mim mesmo para ser um ambulante. Aí apercebi-me logo de que a Luanda de asfalto estava ainda mais reduzida, e a de Musseque se tinha multiplicado assustadoramente. Em poucas palavras, sentia-me sufocado por dentro, a causa da confusão que ia experimentando aqui e acolá, não obstante as alegrias estampadas nos rostos da gente, com qual me deparava. A bela vista da marginal de Luanda e as barracas dos subúrbios como Kazenga se confundem e se contradizem. Na mesma Luanda, os habitantes são entre si incomunicáveis, há como que um grande abismo entre os angolanos podres de dinheiro e os que não passam de miseráveis, lutando pela sobrevivência diária. Os ricaços precisam da mão-de-obra barata, os pobres têm de trabalhar duro, para comer e dormir. Assim, a dita cidade tornou-se num palco espectacular: logo demanhã cedinho vê-se uma bicha enorme de gente empinhada, em fila indiana, transformada em autenticos nómadas citadinos, em contínuo movimento, a procura de restos de vida nas ruas e praças de Luanda. Vive-se ao dia a dia. Para muitos desses, não é realístico pensar num “futuro melhor”, como garante a propaganda governamental. A vida é cada vez mais dura e pesante, apesar dos cinco anos de paz e do propelado desenvolvimento económico. Não obstante isso, ninguém se queixa publicamente. Mesmo os que estão sofrendo na pele esta situação permanecem calados. A miséria não chora provavelmente porque acredita não ter voz audível. A miséria sofre, mas sofre em silêncio.
Por outro, para além dos gradeamentos e cães, é impressionante ver nas noites de Luanda o exército de guardas armados junto às portas de muitas residências, nem mesmo os colonos tiveram tanto medo de si mesmos e dos seus haveres. A beleza das vitrinas e os ecrãs gigantes da publicidade colocados nalgumas artérias da cidade indicam alta modernidade ridicularizada porém pelos buracos poerentos dos passeios e avenidas de Luanda. Faltam serviços eficientes de saneamento e decoro urbano. Luanda está a partir por dentro, e pode desaparecer, nem mesmo a tal Talatona lhe vai substituir. Uma cidade com mais de 4 milhões de habitantes, os autocarros e semâforos são contados nos dedos.
Fora de Luanda, o cenário é porém diferente. Até agora tenho vindo a passar a maior parte do meu tempo diabulando entre zonas de Catete e Huambo. Nestas paragens, pode-se até respirar um ar puro e ter-se um sono profundo, longe dos tormentos caóticos de Luanda. Em Catete, por exemplo, encontrei certas “zonas francas” ou seja oásis: estradas devidamente asfaltadas e sinalizadas, energia contínua e água potável em abundância, coisa raríssima nas cidades superpovoadas de Angola como a de Luanda. Gente que há três anos deixara nas casas de capim exibem hoje residências cobertas de chapas de zinco e motorizadas. O pessoal vai dando o seu máximo na superação da miséria. Só falta o grande impulso administrativo do Estado angolano, proporcionando mais e melhores estradas, electricidade, água potável e saneamento urbano.
Nas muitas dessas “zonas francas” está o dedo empreendidor do governo chinês em colaboração estreitíssima com o Governo angolano. Algumas tímidas iniciativas dos privados angolanos e estrangeiros vêem-se aqui e acolá. Mas, tais oásis quase tornaram-se em espaços de exploração humana devido os “buracos legais”: há problema de concorência desleal, com custos ambientais e sociais enormes; certas empresas estrangeiras lideradas por asiáticos e árabes estão quase isentas de fiscos, completa liberdade de repatriamento de fabulosos lucros e ausência de vínculos de natureza sindical e ambiental, o que cria novas condições de escravidão, dado que a chamada mão de obra barata está sendo desfrutada. Para os poquíssimos angolanos empregados, os salários continuam baixos, cárga horária alta, standard de segurança insuficiente. Os pequenos produtores nacionais são engolidos porque não podem competir com as grandes empresas estrangeiras. Por outro, os serviços e produtos fornecedidos por alguns desses empreendidores estrangeiros são de pouca qualidade por ineficiência dos sistemas e técnicas de controlo e supervisão do Governo angolano, isto para não falar duma certa mentalidade mafiosa em jogo.
A meu ver, faz muita falta a descentralização do poder político e económico, as autarquias, a fiscalização séria e os serviços sociais municipais em Angola. Sem estes pressupostos políticos e administrativos, julgo, Angola vai continuar a ser apenas a Cidade Alta, o resto não passará de grande e caótica Sanzala.

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

creio que elações deste tipo sobre luanda, devem e deviam ser muito divulgadas para que alguns angolanos se dispertem do sonos profundo em que nos encontramos. É muito triste quando se lêm coisas destas, mas o facto é que é mesmo um descrever certeiro de como é e sera luanda futuramente, porque se ate agora não se conseguiu fazer nada, mesmo com os grandes investimentos por parte do governo, numa altura em que a alto do crude é nos muito favoravel, sendo este o maior seblante da económia de angola, não sera logicamente com o passar de anos e mais anos que Luanda vai ser a urbe como alguns ditos intelectos do tal desenvolvimento, quase sem escruplos a chavama para ludibriar, claro as vezes com inocencia, mascarada, a gente que ainda acredita em fadas matrinhas, se assim for luanda precissara de muitas, mas muitas mesmo fadas madrinhas.

10/08/2011  

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